terça-feira, 15 de dezembro de 2020

[D]ESCREVER COM RISCOS - ENTREVISTA A LUÍS PEDRO CRUZ

 


Em janeiro de 2020, a equipa d'O Saltitão, que, na altura, integrava as jornalistas Antonia Herold, Carolina Semedo, Ângela de Sousa, Leonor Prezado, Raquel Carrilho e Mara Morcela, alunas do 4.º ano, convidou o Luís Pedro Cruz, arquiteto de profissão e artista de coração, nascido em Lisboa em 1959, para uma conversa que teve lugar na Igreja de São José, em Castelo de Vide. Ficámos a conhecer alguns desenhos do Luís Pedro e aprendemos muito sobre a importância que têm a arquitetura e o desenho na afinidade com os lugares e suas gentes. 

O Saltitão - Onde é que trabalha? 

Luís Pedro Cruz - Atualmente trabalho na Câmara Municipal de Castelo de Vide, mas tenho trabalhado em vários sítios ao longo do tempo. 

E onde vive? 

Em Castelo de Vide, mesmo no centro, perto da Praça D. Pedro V. 

Tem animais? 

Tive. 

Um cão preto… 

Sim. Foi publicado um livro há pouco tempo, que incide nestes e noutros desenhos que fiz, e na história desta terra. O meu cão acompanhou-me durante todo o processo de desenho e escrita deste livro. O Bart faleceu quando o livro estava praticamente pronto. Portanto, aparece em muitos dos desenhos. 

O que é a arquitetura e o que é ser arquiteto? 

A arquitetura é uma coisa muito vasta… Resumindo, podemos dizer que o arquiteto faz cartas ou que faz intervenções no espaço. O arquiteto planeia coisas destinadas às pessoas. Mas há muitas formas de ser arquiteto. Um arquiteto pode projetar, pode dar aulas; um arquiteto pode também fazer aquilo que eu faço, desenhar, criando ligações com as pessoas de um lugar, levá-las a sentir que o seu lugar é importante, e orientá-las na forma como devem olhar e apreender o espaço que as rodeia. Um arquiteto também pode ser um crítico das obras dos outros arquitetos. Enfim, há muitas formas de se ser arquiteto. A arquitetura é muito importante porque, ao contrário de um artista que faz um quadro ou uma escultura, que podemos optar por conhecer ou não, visitando, por exemplo, uma exposição, a arquitetura destina-se a espaços ou a edifícios que vão ser vividos e utilizados por nós e que, por isso, entram no nosso dia-a-dia.

Quando e como é que começou a desenhar? 

Quando é que vocês começaram a desenhar? Eu comecei a desenhar, tal como vocês, quando era pequenino. E porque, naturalmente, faz parte do nosso crescimento, da nossa forma de olhar para o mundo, começar a riscar, começar a desenhar. 

Porquê desenhar e que ligação tem com a sua profissão? 

Ora bem, todos nós temos a capacidade de desenhar. Eu não sou uma exceção. Mas ser arquiteto marca a minha maneira de olhar. Há toda uma formação, uma educação, e tendo começado a desenhar em pequenino, como já disse, tenho recebido muitas influências ao longo da minha vida - aquilo que vi, aquilo que li. Todas foram muito importantes; e tudo foi absorvido por mim. E eu sou o resultado de tudo isto. Quando comecei a estudar na universidade - fiz a primeira parte do curso no Porto - o desenho era importante. Para projetar uma casa ou outra intervenção, a primeira aproximação era através do desenho. Qual é a vantagem do desenho? Eu, quando estou a desenhar, perco tempo, ou melhor, ganho tempo. Estou nesse sítio, vou riscando… e as pessoas passam, e olham, e metem conversa. Falo com elas e vou ganhando sensibilidade a esse lugar. E isto permite que o trabalho que venha a fazer, em termos de arquitetura, esteja mais ajustado a esse sítio. Depois, o desenho está muito ligado à maneira como nós vemos as coisas, e o que é que isto implica? Implica que temos de aprender a "olhar". A maior parte das vezes não olhamos, não vemos, e daí a dificuldade em desenhar. Há uma coisa que é importante perceber: na vossa idade, desenhar é relativamente fácil; quando ganhamos mais idade, começa a complicar-se. E começa a complicar-se porquê? Porque vocês não têm complexos e desenham e riscam com a maior das facilidades. Mais velhos, começam a ter um termo de comparação. E comparam-se com aquelas pessoas que desenham muito bem. E em vez de esta comparação jogar a vosso favor, torna-se num obstáculo, inibe-vos. O que acontece nos adultos, um pensamento muito usual é “quem me dera ser capaz”, mas, na verdade, nem tentam. O que eu posso dizer é que (a)riscar, sem pretender fazer desenhos extraordinários, é uma coisa que todos nós conseguimos.



O livro [A]riscar em Castelo de Vide foi publicado em dezembro de 2019, editado pela Colibri. Diz o LPC que foi feito a meias com o Bart. Neste livro podes encontrar vários desenhos e escritos sobre a nossa vila. Um percurso cheio de segredos, um itinerário artístico, que te oferece uma visão diferente de Castelo de Vide e das suas gentes.


 


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